Enquanto meio de representação da arquitetura, a fotografia apresenta qualidades indiscutíveis. Com ela, é possível apresentar a um público distante obras erguidas em qualquer lugar do mundo, de vistas gerais a espaços internos e pormenores construtivos - ampliando o alcance e, de certo modo, o acesso à arquitetura.
Entretanto, como qualquer outra forma de representação, não é infalível. Na medida que avanços tecnológicos permitem fazer imagens cada vez mais bem definidas e softwares de edição oferecem ferramentas para retocar e, por vezes, alterar aspectos substanciais do espaço construído, a fotografia, por sua própria natureza, carece de meios para transmitir aspectos sensoriais e táteis da arquitetura. Não é possível - ao menos não satisfatoriamente - experienciar as texturas, sons, temperatura e cheiros dos espaços através de imagens estáticas.
Como parte de nosso tema mensal de fevereiro - representação na arquitetura - conversamos com Lorena Darquea, Montze Zamorano, Manuel Sá, Laurian Ghinitoiu e FangFang Tian, fotógrafos de atuação internacional, para saber suas opiniões a respeito das virtudes e limites da fotografia na representação dos espaços. Leia suas respostas, a seguir.
Montse Zamorano
"Existem vários níveis de virtudes para a fotografia arquitetônica. Por exemplo, a fotografia desempenhou um papel importante ao aproximar a arquitetura de pessoas que nunca teriam sido capazes de visitar alguns edifícios pessoalmente. Também permite que o público tenha contato com várias narrativas e perspectivas no mesmo edifício, com base nos olhares e intenções de diferentes fotógrafos.
No entanto, nunca devemos esquecer que a fotografia é apenas um tipo de mídia, por isso nunca substituiria a experiência de visitar um edifício. Como o som se propaga em um espaço, a sensação de materialidade e textura, vidros e reflexos, etc., são interações físicas que não podem ser percebidas em uma foto. A fotografia é um meio muito importante para explicar a arquitetura, mas nunca devemos julgar a arquitetura com base apenas em uma fotografia."
Manuel Sá
"A fotografia de arquitetura, do final do século XIX até hoje, permanece essencial ao apresentar novidades para o mundo. Projetos que provavelmente nunca seriam conhecidos podem entrar num circuito de êxito arquitetônico mundial. O próprio Peter Eisenman brinca que, caso Corbusier não tivesse publicado seus livros no início do século XX, provavelmente nunca saberíamos da existência dessas obras icônicas espalhadas no interior da França. Enquanto técnica de representação, os limites da fotografia de arquitetura vivem em constante tensionamento.
Em especial, a transição da fotografia química para a digital, que ainda está sendo digerida enquanto possibilidade, aproxima a fotografia da pintura, pois, menos preocupada em registrar o momento, acaba muitas vezes se alinhando com a visão original do arquiteto, tanto através da manipulação da imagem quanto através dos recursos de exposição, cores, luzes, sombras e camadas fotográficas. No final do dia, a fotografia de arquitetura ainda é simplesmente fotografia, regida pelo que lentes e câmeras oferecem, mas sem dúvidas a manipulação digital possibilita novas fronteiras na percepção e entendimento do projeto ao passo que as vezes se afasta do instante decisivo e mergulha num mar de informações em camadas."
Lorena Darquea
"Uma das virtudes da fotografia arquitetônica é que ela funciona como um condutor para diferentes espaços e experiências arquitetônicas, o que permite que você conheça o comportamento do usuário com o projeto e seu contexto. É um meio que conecta projetos de um lugar do mundo para outro, permite vivê-lo, estudá-lo e compreendê-lo completamente. A estreita relação que este meio de representação tem com a luz é tão delicada e complexa que os resultados são magníficos, quando feitos corretamente.
Ironicamente, um dos limites é a própria tecnologia. É fácil e rápido tirar fotos, muitas fotos, por isso mesmo, é muito fácil abrir mão de parar e viver o espaço para fotografar - algo que não era possível antes porque você tinha poucas fotos."
Laurian Ghinitoiu
"Os arquitetos projetam espaços como uma coreografia, onde o movimento da luz é previsto e o comportamento das pessoas é parte do projeto, ou é dirigido de uma maneira específica - e podemos ver isso facilmente a partir de renderizações. Sou atraído pelo inesperado, procuro sempre situações únicas e aleatórias, uma sincronização espontânea de "momentos decisivos", o cotidiano em torno da arquitetura projetada no ambiente construído. Na minha opinião, registrar o contexto com sua informalidade é tão valioso quanto a própria arquitetura, e a fotografia é uma das ferramentas para atingir isso.
Embora possamos registrar o movimento ou o tempo através do nosso trabalho, a fotografia tem uma limitação. Muitas vezes sinto que a fotografia é muito rígida para representar o espaço, o que me fez experimentar com o vídeo. Juntamente com Arata Mori (cineasta e artista visual), fundamos o anothertwo (another:) como uma abordagem para expandir este campo de visão."
FangFang Tian
"Penso que a fotografia de arquitetura discutida aqui é uma fotografia relativamente limitada, que é justamente o tipo de fotografia de arquitetura a serviço dos arquitetos. Baseada no próprio projeto arquitetônico, é uma expressão objetiva e também uma recriação. As virtudes são óbvias, especialmente nesta era da informação: a fotografia, afinal, é um importante meio de comunicação. Após a construção do edifício, a fotografia permite refinar o foco do arquiteto e transformar suas ideias em uma linguagem imagética fácil de ler, ampla e rapidamente publicada em websites e várias mídias sociais.
O limite da fotografia de arquitetura está na desilusão da própria fotografia. Durante a sessão de fotos, diferentes composições e escolas de lentes podem trazer diferentes experiências espaciais. No estágio posterior, durante a etapa de edição das imagens, é possível encobrir muitas falhas, então é difícil confiar nas fotos. Conhecer um edifício é muito questionável. Em segundo lugar, a limitação da fotografia é que ela não pode substituir completamente a sensação do espaço, o toque do material, a intensidade da luz, a mudança do som, os sentidos...
Muitos jurados de prêmios insistem em visitar o projeto. Isso é importante. Como fotógrafos de arquiteturas, devemos explorar ativamente as fronteiras da fotografia, potencializar forças e evitar fraquezas, e usar este meio especial para servir à indústria e promover ativamente a disseminação e a troca da cultura arquitetônica."
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Publicado originalmente em fevereiro de 2019, atualizado e republicado em 19 de agosto de 2020 por ocasião do Dia Mundial da Fotografia.